O Euro, a ajuda à Grécia e o Projeto Alemão
Segunda Parte - Final
por Wilson R Correa
Minar o Dolar e o poderio econômico norteamericano na Europa, limitar o uso do Dolar nas negociações entre países europeus e, em um segundo momento, impor o Euro ao resto do mundo, ocupando espaço do Dolar, esse é o grande objetivo da União Européia.
Isso significaria garantir o próprio mercado europeu aos países europeus; e, em seguida, conquistar os mercados do Dolar para os países europeus e seus produtos.
O Dólar no comércio do petróleo e a Guerra do Iraque.
Para rememorar, a guerra do Iraque pode ser lembrada como um momento de definição da permanência do Dólar no mercado do petróleo, como um espaço para o dólar, pois Sadam Hussein impusera negociações em Euro para o petróleo iraquiano. Isso não pode ser esquecido.
Para além da Guerra do Iraque, a luta norte americana pela manutenção do Dólar como moeda internacional continuou sob a forma de chantagem econômica e militar.
Chantagem atômica para manutenção do Dólar como moeda internacional
Por um lado, as visitas de Hillary Clynton, como Secretária de Estado, à China, ao Japão e à Alemanha, logo no início do governo Obama, destinaram-se a garantir a presença dos governos desses países no mercado financeiro internacional, viabilizando a colocação de títulos governamentais norte americanos e o consequente financiamento dos gastos públicos dos EUA. Com Alemanha e Japão, essa parceria data dos anos 70; com a China, dos anos 90.
Por outro lado, o acordo atômico entre EUA e Índia, em 2010, funcionou como uma chantagem militar contra a China e contra seu pleito por uma nova moeda internacional: uma ameaça de equipar a Índia com arsenal atômico moderno, no caso de rompimento do acordo de sustentação do dólar e da dívida pública norte americana pela China.
O movimento chinês e dos BRICs em prol de uma nova moeda internacional é um recado em contrário a esse interesse norte americano e à continuidade da parceria monetário-cambial sino-americana. E força os EUA a um rápido ajuste do qual os sinais evidentes ao público são a descontinuidade das guerras do Iraque e do Afeganistão, a tentativa de revitalização da política fiscal norte americana por Obama, por meio da tributação aos mais ricos e redução dos benefícios fiscais às grandes corporações. E também a injeção de recursos na economia através da compra de títulos governamentais no mercado financeiro, os Quantitative Easing, QE1 e QE2.
Hesitação Alemã e Francesa, temor da inflação e de seu impacto eleitoral abrem espaço para atuação intensa do FMI na Europa
Ainda neste março/2011, Alemanha e França ainda hesitam em apoiar a Grécia, Portugal, Itália e Espanha, por meio da liberação de recursos lastreados em novas emissões monetárias pelo Banco Central Europeu.
Mas, emitir moeda para salvar o Euro é compatível com o plano estratégico alemão de longo prazo. Mas essa medida aterroriza economistas, autoridades monetárias e eleitores alemães que vislumbram no horizonte a sombra da hiperinflação que arrasou a Alemanha nos anos 20 do século passado.
A missão de Ângela Merkel é convencer os eleitores alemães – ainda que não possa afirmá-lo com todas as palavras – que deve ser dada continuidade ao plano estratégico longo prazo do país, que já obteve relativo sucesso na primeira etapa, a de unificação das duas Alemanhas.
Sob esse impasse, o FMI abre seu âmbito geográfico de atuação, antes circunscrito aos países em desenvolvimento. A Alemanha reage lançando a proposta da criação de um FMI exclusivamente europeu, mascarando a inoperância do Banco Central Europeu ao longo da crise.
Estratégia possível para a Alemanha
Para a chancelaria alemã resta ainda fortalecer a União Européia e o Euro para posicioná-lo como a moeda de trocas internacional e para garantir o mercado europeu para o empresariado alemão e europeu:
a) apoiando no curto prazo as medidas norteamericanas no sentido da valorização do yuan, no que isso representa de perda de competitividade dos produtos chineses na Europa e demais países;
b) rechaçando as investidas chinesas e dos demais BRICS para estabelecimento de uma nova moeda internacional distinta do Dólar, enquanto a Europa está enfraquecida e a China, fortalecida;
c) apoiando os planos de regulação e recuperação do sistema financeiro europeu;
d) apoiando a estabilização das economias das nações européias;
e) negociando acordos comerciais com outras áreas de comércio de nações, como o Mercosul, e com países, de modo a garantir espaços de comércio para produtos europeus;
f) boicotando o ressurgimento da Citi Londrina como centro financeiro mundial;
g) buscando que sejam direcionados recursos dos BRICs à compra direta de títulos da dívida soberana grega, espanhola, portuguesa e italiana, ao invés da mera disponibilização de recursos dos BRICs à capitalização do FMI, para que fique por conta do Banco Central Europeu, e não do FMI, o direcionamento de recursos e o monitoramento da economia, da política fiscal e da política monetária dos países europeus em dificuldades.
"O combate alemão à inflação no curto prazo é incompatível com o plano alemão de longo prazo de reconquista da soberania territorial e mercadológica alemã e européia"
No momento, considerada a estratégia alemã de longo prazo, a mais importante missão de Ângela Merkel é menos o controle das emissões monetárias pelo Banco Central Europeu e o eventual processo inflacionário que delas poderia resultar; e muito mais o rápido apoio à Grécia e soerguimento da economia de Espanha, Itália, Portugal e Irlanda.
Interesses imediatistas e eleitorais podem já estar obnubilando o projeto alemão de longo prazo. Mas, tal como Helmut Kohl passou para a história por reunificar as duas Alemanhas – a RFA e a RDA, comemorada em 03.10.1990, e que completa neste mês onze anos – Angela Merkel igualmente poderá passar para a história como a chanceler que impediu o desmoronamento da UE sustentando a permanência do Euro. Poderá ser reconhecida por ter mantido as bases para a independência européia em relação à política monetária norte americana e para certo isolamento europeu em relação à decadência do dólar, bem como, principalmente, para uma distante reconquista da soberania mercadológica e territorial pela Alemanha e pela Europa.
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